As emissões de FIIs de tijolos voltaram e as polêmicas também | Por Ricardo Figueiredo

As emissões de FIIs de tijolos voltaram

As emissões de FIIs de tijolos voltaram e as polêmicas também. Artigo de Ricardo Figueiredo, especialista em fundos imobiliários da Spiti.

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“Segundo trimestre de 2023: alta de 14% do Ifix; queda de 220 pontos na ponta longa da curva de juro futuro expressa pelos contratos de futuro de DI negociados na B3; quase 100 pontos de queda na taxa do Tesouro IPCA+ 2035. 

Com a aceleração da recuperação dos preços das cotas dos FIIs e perspectivas de início de cortes na Selic já na reunião do Copom em agosto, os fundos imobiliários de tijolos iniciaram um movimento que há tempos desejavam, mas as condições de mercado impediam: emissões de novas cotas.

A obrigação legal de distribuir no mínimo 95% de seu lucro a cada semestre causa um efeito colateral aos fundos imobiliários. Um FII só consegue acelerar seu crescimento se captar recursos para realizar novas aquisições. No mais, fica à mercê da valorização de seu atual portfólio e, eventualmente, de uma aquisição através de alavancagem — o que vimos no último ciclo acabou colocando alguns FIIs em condições delicadas por conta do custo financeiro de tais dívidas.

Sim, as emissões de novas cotas são deveras importantes para o crescimento da indústria de fundos imobiliários. Elas são boas oportunidades para os institucionais acessarem uma classe de ativos que ainda carece de maior liquidez para investidores de grande porte. FIIs maiores tendem a ampliar sua liquidez no mercado secundário retroalimentando o interesse dos institucionais.

Assim como em ações, conforme a liquidez dos fundos imobiliários cresce, vemos menor distorção na precificação no seu mercado secundário. As novas aquisições para os portfólios ampliam a diversificação e tendem a melhorar o nível de risco destes.

Parece que as emissões, então, são uma dádiva, só têm benefícios para os investidores. Mas nem sempre esse mundo é o passeio no bosque que mencionei até aqui.

Algumas emissões, inclusive, chegam carregadas de críticas. Todas são boas para os respectivos FIIs? São sempre positivas para os cotistas? O atual cotista de um FII que enxerga a emissão como benéfica deve necessariamente exercer o direito de preferência e comprar mais cotas no processo? E os custos, são justos? 

Vamos comentar algumas emissões que estão em pauta, mas não para que minha percepção seja caracterizada como verdade absoluta — longe disso —, mas para fomentar o bom debate com meus dois centavos advindos de quase 20 anos nesse mundo fascinante do mercado financeiro.

Começando com a 9ª emissão do HGLG11, a gestão do FII, do Credit Suisse, veio a mercado com a missão de captar a cifra de R$ 1,5 bilhão. A principal finalidade da oferta foi a aquisição dos quatro ativos do GTLG11. Falamos de imóveis de alto padrão em especificações técnicas no universo logístico e com localização premium, o chamado raio 30 km da cidade de São Paulo, área em que o portfólio do maior fundo de logística da indústria tinha pouca presença.

A aquisição “resolve” o calcanhar de Aquiles do FII e, de quebra, o posicionará como o maior fundo imobiliário de tijolos da indústria, seja na visão de metragem sob gestão, seja em patrimônio líquido. Os imóveis foram adquiridos por valor em linha com o mercado, gerando um rendimento satisfatório. O custo da oferta foi de 2,10% e a cota de emissão foi R$ 152,50, abaixo do valor de mercado, que, no momento do anúncio, estava acima de R$ 160 e em linha com o valor patrimonial. É aquela emissão para a qual as críticas vêm de quem tem a arte de criticar como atividade preferida nas horas vagas.

O XPML11, FII de shopping centers da XP Asset, realizou em junho a sua 8ª emissão. O alvo era captar R$ 300 milhões, mas o resultado foi melhor: uma captação de R$ 375 milhões. A cota na emissão foi de R$ 98,60 e o custo da emissão de R$ 1, ou seja, 1,01% (guarde este número), o que gerou um custo total para quem entrou na emissão de R$ 99,60 por cota.

O valor patrimonial da cota na emissão foi de R$ 98,43 — sem “pancadaria” por conta de emissão abaixo do patrimonial, ufa! Além de ampliar participação no Shopping Cidade Jardim, o valor também serviria para comprar mais uma fatia do Shopping da Bahia e efetuar o pré-pagamento de parte da alavancagem do fundo. Bons negócios, mais uma vez o checklist de uma boa emissão aparentemente estava gabaritado.

Mas aí veio o mês de julho e o anúncio da 9ª emissão. Mal os recibos de quem subscreveu a 8ª emissão haviam sido convertidos em cotas e eis que surge mais uma do referido FII. A primeira chuva de críticas veio com o argumento de falta de planejamento. Se você “sabe” que vai comprar mais ativos, por que não fez tudo em uma emissão só?

Fóruns e redes sociais de investidores de FIIs foram tomados por críticas nessa linha, com direito a vídeo de influencer revoltado, para fechar a lista de barbaridades de quem parece não ter o mínimo de noção do que é a negociação de um ativo imobiliário.

Para essa turma, eu digo: não, não é como comprar maçãs no supermercado. Deu vontade de comer uma maçã, vou ao supermercado, vejo centenas empilhadas, pego aquelas que eu preferir, pago e vou para casa.

A aquisição de um imóvel leva meses, por vezes, mais de ano para ser concluída. Alguém pode questionar: “Ricardo, mais uma razão para sustentar a tese de que daria tempo de organizar melhor e fazer apenas uma emissão”.

Lembro que há aquisições oportunísticas que, por vezes, aparecem sem que o gestor do fundo estivesse procurando. Imagine a seguinte situação: você é proprietário de uma fração de um shopping center. Seu sócio, sem que você soubesse, recebeu uma proposta de compra da fração dele. Ele topou, mas como manda a regra, deve submeter tal oferta a você, porque você tem o direito de preferência para igualar a proposta e comprar a fração de seu sócio.

Se você é gestor de um FII, pode até achar a proposta interessante, mas dificilmente terá dinheiro em caixa para efetuar a compra. Sua saída será chamar uma emissão para captar recursos para a compra ou se alavancar. Eu tendo a preferir compras “limpas”, sem alavancagem, para shopping center, e em outra oportunidade voltarei aqui para explicar as razões.

Mas fato é que tal direito de preferência tem prazo para resposta, por isso o gestor deve ser célere na tomada de decisão. E a oportunidade aparece sem mandar recado, pode ocorrer logo após uma emissão ou, ainda, no meio de uma emissão em curso e o gestor não a interromperá por conta disso.

É o que aconteceu com o XPML11 nesta 9ª emissão? Não sabemos de fato porque aqui temos um motivo para uma nova onda de críticas neste evento. O material da emissão é muito vago quanto ao uso dos recursos captados. Fala apenas em aquisição de ativos imobiliários (ufa, pensei que iria comprar minério de ferro — contém ironia) e expansão de ativos imobiliários do fundo, aqui talvez numa sinalização mais clara. 

Outro uso previsto no material da oferta para o recurso captado é a chamada otimização da estrutura de capital. É sério, senhor gestor? Custa ser um pouquinho mais claro com o distinto público? No popular pessoal, o sentido aqui foi: vamos seguir com a desalavancagem (o que de fato é ótimo para o fundo). Mas se a ausência de maior clareza na aplicação dos recursos pode ser vista como negativa, também é compreensível, ao menos para quem já negociou um ativo imobiliário comercial de grande porte.

É possível, e não raro, que uma das partes peça sigilo na negociação. Cláusulas de confidencialidade são carregadas de severas multas. O gestor pode estar diante de uma oportunidade excelente para o fundo, que colocará mais retorno no bolso do cotista, mas não pode divulgar nada antes da conclusão por conta da confidencialidade colocada como condição pela contraparte. Ele deveria rejeitar tal negócio? A meu ver, não. Afinal, certo grau de confiança é condição sine qua non para investir em um FII. Se não confio na gestora, por que colocaria meu dinheiro em um fundo em que ela toma as principais decisões?

A outra crítica veio sobre aquele número que te pedi para memorizar sobre a 8ª emissão: o custo de 1,01%. Já na 9ª emissão, tal custo atingiu 3,47%. A cota mais uma vez será emitida em linha com o valor patrimonial e, desta vez, o alvo será captar R$ 450 milhões. Esse custo maior incomodou os investidores. 

Tem explicação para a diferença? Tem! A 8ª emissão foi destinada a investidores profissionais, dessa forma, demandou menor esforço de venda. Parte relevante do custo é justamente para remunerar esse esforço de venda do conjunto de corretoras que participam da emissão na figura de distribuidores. 

Já a 9ª emissão é para público geral, tanto que possui prospecto conforme exige a regulação. É provável que, nesta situação, o esforço de venda seja maior, portanto, o custo da emissão crescerá. Acredito que seja ponto pacífico que uma oferta para investidor profissional apenas terá custo inferior a uma destinada para todos os perfis. Agora, cabe a cada um avaliar se tal diferença é justa ou não, só achei importante frisar que a diferença é inevitável.

Tudo isso que fiz foi para defender a gestora? Não, a XP Asset não precisa que um simples analista saia por aí em sua defesa. Até porque eu não tenho o menor interesse nessa tarefa. Apenas compartilhei pontos que deveriam ter sido considerados por quem criticou a 9ª emissão do fundo e que, por óbvio, não o foram.

E encerro com a emissão que batizei de “Pênalti do Pelé”. 

“Um golaço, Ricardo?”

Não, na verdade, indefensável!

A 3ª emissão do LGCP11 visa captar R$ 51,5 milhões para adquirir participações adicionais em quatro imóveis que já estão no fundo. Direto ao ponto.

• A emissão é feita por preço de cota, R$ 80,80, ou seja, 21% abaixo do atual valor patrimonial da cota, de R$ 102,20. Considerando a atual quantidade de cotas do fundo e o número presente na oferta base, teríamos na largada uma destruição de mais de 5% do patrimônio, nada desprezível.

• As frações dos quatro imóveis estão sendo adquiridas pelo valor médio de R$ 3.419/m². Não diria que as localizações são ruins, mas apenas ¼ dessa ABL está na principal região logística do país, o raio 30 km de São Paulo. Considerando que a receita gerada fique na média daquilo que os mesmos imóveis estão gerando hoje, o cap rate estabilizado seria de 8,24%. Vale lembrar que depois teríamos que tirar os custos do fundo para ver como fica a renda do cotista; estamos falando, então, de uma aquisição que vai gerar de fato para o cotista um DY estabilizado inferior a 8% a.a., mais próximo de 7,5% a.a. Seguramente, há opções no mercado secundário muito mais atrativas no universo logístico. Pode ser gerada mais renda através de uma alavancagem? Pode. Por isso faço o cálculo sem considerar alavancagem. Compra de ativo imobiliário boa para em pé sem esse recurso. Se precisar de alavancagem para se justificar, na humilde opinião deste analista, é no mínimo neutra e, na maioria dos casos, é ruim mesmo.

• Por fim, os imóveis estão sendo comprados pelo LGCP11, da Log CP (LOGG3). A gestora do FII é a Inter Asset e a distribuição da oferta será da Inter DTVM, ou seja, esta receberá boa parte dos 2,2% do custo. O terreno fértil para conflito de interesse está aí. Dá para mitigar? Sim, mas o desconforto deste analista com tal situação e as boas alternativas que temos no mercado secundário que não trazem essa preocupação me fazem refletir: vale a pena?

Há emissões com as mais diferentes características. Muitos fatores no mundo imobiliário não são tão simples como alguns pintam nas redes sociais. Em algumas ofertas, é preciso um esforço hercúleo para achar algo positivo (para o cotista). Lembre-se de analisar cada uma de forma individual e depois, sim, comparar com outras. Seja fiel aos seus princípios de alocação e justo com os aspectos relevantes para o mercado”.

(*) Fonte de conteúdo: Ricardo Figueiredo, especialista em fundos imobiliários da Spiti.

Blog do Grana é a página de conteúdo informativo do aplicativo Grana Capital, parceiro da B3 para ajudar os investidores com o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).

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