
Nenhum prêmio compensa o risco da ruína. Por Ricardo Schweitzer*
“Case e você vai se arrepender. Não se case, e você também vai se arrepender. Casar ou não casar, você vai se arrepender de qualquer maneira. Ria da loucura do mundo, você vai se arrepender. Chore sobre isso, você vai se arrepender também. Se enforque, você vai se arrepender. Não o faça e você vai se arrepender disso também. Quer você se enforque ou não, você vai se arrepender de ambos. Isto, senhores, é a essência de toda a filosofia.”
Hoje a inspiração para o tema que quero abordar vem dessa citação do filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard, em seu célebre “Ou Isso, Ou Aquilo: Um Fragmento de Vida”.
Eu me delicio com esse trecho e sobre ele poderia falar por dias e dias. Mas, para meu próprio bem, vou me restringir a investimentos:
Se você apostar na queda dos juros longos, você vai se arrepender; se você preferir ficar concentrado nos curtos, você vai se arrepender. Se você comprar ações ligadas ao mercado doméstico, você vai se arrepender; se você comprar exportadoras, adivinhe: você vai se arrepender.
Se você montar um portfólio de dividendos, você vai se arrepender; se você se jogar em promessas de crescimento acelerado, você vai se arrepender. Se você comprar fundos imobiliários, você vai se arrepender; se não comprar fundos imobiliários, você vai se arrepender. Ouro? Dólar? Idem.
E se você não fizer absolutamente nada disso? Quebrar a janela com um bebedouro e sair correndo em direção à floresta para nunca mais voltar? Adivinhe…
Sim! Você vai se arrepender. Por quê?
Qualquer decisão que você tomar, em algum momento, inevitavelmente fará você pensar nas alternativas que preteriu e nos caminhos que não seguiu. Two roads diverged in a yellow wood, and sorry I could not travel both…
Isto porque virá aquele momento em que o juro longo vai abrir bruscamente e as suas NTN-Bs 2035 vão desvalorizar como bolsa em dia de circuit breaker. Da mesma forma que haverá aquele dia em que o juro longo vai desabar e você vai se sentir estúpido porque não alongou a carteira o bastante — ou, tanto pior, ficou demasiadamente concentrado nas LFTs.
Há de chegar aquele momento em que a tese da retomada da economia vai pegar fogo e todas as ações de varejo, bancos, shopping centers e real estate vão decolar. Da mesma forma, vai chegar o dia em que será óbvio para todo mundo (menos você, é claro) que há mais bolhas na China do que nos pés de um peregrino chegando a Santiago de Compostela e todas as companhias de commodities vão desabar como (quase) nunca antes visto.
Em certos momentos você se sentirá ultrapassado, porque suas empresas pagadoras de dividendos serão capazes de matar um bicho preguiça de tédio e oferecerão retornos minguados enquanto todos à sua volta — aqueles traders arrojados que tiram foto de braços cruzados com o trading desk lotado no fundo — estarão fazendo fortunas com empresas que nunca emitiram uma nota fiscal, mas fizeram um powerpoint bonito.
E outros, nos quais você se sentirá um grandessíssimo idiota porque acreditou no Eike, em Positivo a 30 reais, na cadeia de fornecedores do pré-sal e naquele setor — aquele, o mais resiliente de todos — que foi trucidado por um canetaço dilmístico que, subitamente, virou as regras do jogo do avesso.
(Essa conta está sendo paga até hoje, sabia?)
Você viverá para ver aquele fundo imobiliário maravilhoso anunciar que seu principal locatário entrou em recuperação judicial e a vacância saltou de 2 para 86 por cento. E vai se sentir um imbecil por não ter comprado aquele outro que negociava ao equivalente a 8 mil reais por metro quadrado de ABL ao lado de lajes ofertadas a 15 mil e completamente tomadas.
Em algum momento, o ouro vai cair bem na sua cara. O dólar, idem. E rasgarão os céus mediante a eclosão da próxima (e óbvia, como sempre — mas só após ocorrer) crise financeira global — que virá, tenha certeza.
E quando cada uma dessas coisas acontecer, você vai se sentir um imbecil — ou porque estava posicionado errado, ou porque estava posicionado certo, mas não o bastante.
Deu certo? Puxa, devia ter arriscado mais — perdi oportunidade! Deu errado? Nossa, onde eu estava com a cabeça?
Estava com a cabeça no lugar de sempre: logo acima do pescoço, com um conjunto limitado de informações na mão e a necessidade de tomar uma decisão. É sempre assim.
Julgar depois é fácil e inerentemente injusto. Não perca seu tempo com isso.
Repito: não perca seu tempo se lamentando. A vida é vivida olhando para a frente.
Mas quando você compreende e aceita que suas escolhas — quaisquer que sejam — serão sub-ótimas; quando você reconhece que não é Super-Homem, as coisas começam a trabalhar a seu favor.
A partir do momento em que você aceita que qualquer que seja o desfecho, você vai se arrepender de alguma forma, suas escolhas passam a ser na direção de quais erros aceita cometer ou não.
Insisto: faça um esforço deliberado no sentido de escolher quais erros você se dispõe a cometer — pois você vai cometê-los, queira ou não. É questão de tempo.
O que é melhor? Deixar de ganhar ou perder? Realizar lucro cedo demais ou realizar perda tarde demais? Ficar de fora da próxima grande coisa ou estar embarcado na grande cilada do momento?
Você pode sobreviver por anos realizando lucros cedo demais ou arriscando menos — e, a despeito de uma boa dose de frustração ao longo da jornada com como poderia ter sido se…, chegar ao final disso tudo relativamente bem. Por outro lado, um único grande risco tomado equivocadamente pode levá-lo à ruína, de maneira irreversível.
Você é diariamente bombardeado por pessoas que surgem do nada com ideias mirabolantes. Quando elas dão errado, eles apenas desaparecem, devidamente substituídos por uma nova leva de novas faces com novas ideias.
Conto-te um segredo: se você embarcar e se der mal, ao contrário do sujeito que desapareceu na névoa, seu reflexo continuará no espelho encarando você.
Vale a pena?
Eu prefiro sempre a alternativa que, mesmo mediante a recompensa menor, oferece uma segunda chance amanhã.
Então pergunto: que tal uma revisão no portfólio em busca de riscos que você não quer realmente correr?
*Ricardo Schweitzer é analista CNPI, consultor CVM e investidor profissional.
Twitter: @_rschweitzer, Instagram: @ricardoschweitzer