Aceite: sempre vai ter um problema | Por Ricardo Schweitzer

Artigo de Ricardo Schweitzer

Ideal do “céu de brigadeiro” afasta pequeno investidor das oportunidades. Por Ricardo Schweitzer*

Confesso: andava desanimado. Passei os últimos dois anos resignado com os desafios que a fase mais grave da pandemia impunha às empresas e convicto de que muitas virariam essa página mais fortes do que nunca, colhendo os frutos de lições aprendidas na marra, por força das infelizes circunstâncias. 

Mas contava também com uma retomada razoável da atividade à medida que as restrições caíssem; que a vida voltasse ao normal. É fato que isto se viu nos números do terceiro trimestre de um bom punhado de empresas, mas dou o braço a torcer: não é um movimento generalizado. E os indicadores de atividade dão pistas de que, de fato, por ora é isso aí o que temos mesmo.

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  • Por outro lado, muito mais generalizadas foram as sinalizações de pressões de custos – reflexo da inflação que nosso Banco Central está apanhando para conter, e cujas iniciativas terão novos efeitos sobre a atividade econômica no ano que vem… 

    A cada semana, pioram as expectativas de inflação e PIB – e as de 2022 e adiante começam a dar sinal de desancoragem, que chamará ainda mais ação do BC, que afetará ainda mais a velocidade da retomada…

    …e aí ainda lembramos que ano que vem tem eleição; que a pauta legislativa empacou.

    Peço perdão a você, leitor. E também à turma do Grana, que tão gentilmente me cede este espaço. Mas às vezes as circunstâncias exigem que deixemos a educação de lado:

    Mas que MERDA! Se não vão ajudar, pelo menos não atrapalhem, porra!

    Feito o desabafo.

    Mas eis que… é interessante como, às vezes, a vida coloca no nosso caminho exatamente o que a gente precisa.

    Estava em meio às minhas leituras do final de semana quando me deparei com uma entrevista do José Isaac Peres – o fundador da Multiplan – para O Globo

    Era sobre a inauguração de um novo shopping no Rio de Janeiro. Lá em 2019, quando o empreendimento engatinhava, Peres estava francamente otimista com Brasília. E agora abre o aparelho em meio a um dos piores anos da história da sua indústria.

    Questionado sobre os infortúnios do momento – mais especificamente sobre a dinâmica da inflação, essa maledeta que volta-e-meia volta a dar as caras em terras tupiniquins -, Peres desferiu uma resposta que me tirou o chão:

    No Brasil, se você esperar os problemas passarem, nunca vai fazer nada. Sou empresário há 55 anos e a cada 5 anos sempre tinha um problema.

    E isso me trouxe de volta para a realidade; para a vida como ela é.

    Se você quer investir no Brasil – e, particularmente, sigo pensando que isso faz sentido -, acostume-se com a ideia de que o nosso normal é esse. É problema atrás de problema; é a turma de Brasília metendo os pés pelas mãos 99% do tempo e, de vez em quando, quase por acidente, fazendo algo de certo e de bom independentemente da cor do partido no poder. É o país do passado incerto, das oportunidades perdidas de novo e de novo e de novo… 

    De vez em quando vem um choque externo positivo, que aproveitamos menos do que poderíamos. De vez em quando ocorre algum alinhamento astrológico muito particular que faz com que alguma questão estrutural interna evolua. Mas o normal, o dia-a-dia, é essa lenga lenga costumeira.

    Só que, em meio a isso tudo, tem gente que avança. Tem empresa que cresce, remando mais forte contra a maré bravia. É difícil e dá uma gastura sem tamanho. Mas é assim que é.

    Aqueles momentos de ventos a favor, de Brasília colaborando, cenário externo favorável, Cristo Redentor decolando… é tudo lindo, mas não é o normal. E se você esperar por essa exceção à regra para investir, espere mui confortavelmente sentado(a). Não é assim que a banda toca nestas terras – e provavelmente nunca será.

    Estamos fadados a ser essa coisa meia-boca que nunca deslancha mas, ao mesmo tempo, nunca degringola de vez. O mesmo Peres, em outra entrevista recente, recorda Austregésilo de Athayde e mata na mosca: a virtude do brasileiro é que ele chega a um acordo de entendimento depois da exaustão de tanto discutir a mesma coisa. Aqui é assim: uma bagunça geral, mas depois o cara fica exaurido e faz um acordo porque ninguém aguenta mais.

    Então, em resumo, faça-se o favor de abstrair. Não pense em crise: trabalhe. E invista em quem está trabalhando – e já contando, de antemão, com a corrente contra… – ao invés de esperar que tudo fique bem para fazer alguma coisa.

    É esse o olhar com o qual tenho revisitado minha carteira após a temporada de resultados. Quais empresas têm capacidade de entregar mesmo com o macro mandando contra? Quem sabe remar contra a corrente?

    É com esses que eu quero estar. E convido você à mesma reflexão.

    Até a próxima.


    Ricardo Schweitzer é analista CNPI, consultor CVM e investidor profissional. 

    Twitter: @_rschweitzer, Instagram: @ricardoschweitzer

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