Vejo muita gente reclamando da queda repentina que a bolsa vem tendo nos últimos meses. Muitos investidores justificam que tudo se resume a dólar, preço dos commodities, incerteza política…, mas a verdade, é que o problema vai muito mais a fundo. Podemos resumir 90% desse problema a algo chamado de Custo de Capital. Para entendermos como ele funciona, bora falar um pouco sobre o Valuation.
Dentro do Valuation, utilizamos uma taxa de desconto para as ações chamada de Custo de Capital da empresa, ou para os mais chegados, o famoso WACC. Ele é calculado pela média do KE (Custo de Capital Próprio), ou seja, dos acionistas, e KD (Custo de Capital de Terceiros), dos credores, ambos ponderados pelo Patrimônio Líquido e pela Dívida Onerosa total. Resumidamente, ele vai pegar os Fluxos de Caixa futuros da companhia e vai reduzir seu valor com base na taxa de desconto definida.

O KD é calculado pela fórmula:
KD=YTM x (1-Alíquota de IR) x 100
Resumidamente, o YTM é a taxa a ser paga nas debêntures de dada companhia no momento de investimento, até o vencimento da mesma. Podemos interpreta-la então, como o valor médio que os credores cobram para emprestar seu dinheiro.
Ok, mas qual o efeito que isso causa nos seus investimentos?
Na Maioria dos casos, as dívidas são pós fixadas, ou seja, tem suas taxas atreladas a algum outro indexador. Normalmente ele é a própria taxa Selic, ou algum que tenha relação direta com a mesma.
Caso você acompanhe o mercado, deve ter percebido que a taxa Selic segue subindo bastante e com expectativa de chegar perto dos 10%. Isso faz com que o custo da dívida dessas empresas aumente, já que o YTM aumenta também.
Por exemplo, se você tivesse feito um empréstimo a juros de 5% e eles subissem a 15% durante o ano, você não iria pagar sobre os 5%., e sim sobre o valor mais atual. Os juros pagos aumentariam, resultando no aumento do seu custo de dívida.
Nesse cenário, empresas que necessitam de grandes captações e que tem baixo grau de amadurecimento acabam se prejudicando bastante, já que o valor cobrado pelos credores para emprestar seu dinheiro, aumenta. Fica mais difícil de financiar as operações.
Agora que você entendeu tudo sobre o KD, vamos falar um pouquinho sobre o KE, o custo de capital próprio das companhias.
Enquanto o KD media o quanto os credores cobram para emprestar dinheiro, o KE mede quanto os acionistas deveriam esperar de retorno para aportar seu dinheiro na companhia. Seu cálculo é dado pela fórmula:
KE = Taxa Livre de Risco + (Beta x Prêmio de Risco)
Normalmente, sempre se utiliza para o cálculo da Taxa Livre de Risco, o retorno do título público pós fixado, de maior prazo e sem o pagamento de juros semestrais. Isso acontece porque a chance de o governo falir é a menor dentro de um país. Se ele vier a falir, a tendência é de que todas as empresas venham a desmoronar antes. Mesmo assim, existe a chance deles te darem um calote, por isso descontamos do retorno, o valor do CDS, uma espécie de seguro que cobra o percentual de chance de isso vir a acontecer.
O Beta, por sua vez, é utilizado como uma medida de risco. Não vou me aprofundar muito porque ele pouco interfere no assunto que estamos falando, mas, resumidamente, ele mede a volatilidade de um ativo X com base em um índice Y.
O Prêmio de Risco, por sua vez, mede qual o retorno a mais que os investidores devem cobrar para emprestar seu dinheiro para as empresas e não para o governo, afinal o risco é bem maior. Normalmente se utiliza de 6,5 a 7,5%
A taxa de juros também vai afetar e muito essas variáveis. Com os juros subindo, o retorno dos títulos públicos aumenta. Alguns já estão chegando perto dos 15% a.a. Logo, o retorno a ser exigido pelos investidores também aumenta, caso contrário não valeria ao risco.
Lembra que eu falei sobre o WACC lá no início? Então, todos esses aumentos no KE e KD, aumentam a taxa de desconto que incide sobre os Fluxos de Caixa futuros. Logos, com esses fluxos diminuindo, o valor da empresa diminui e o retorno intrínseco do investimento, também. Os investimentos em renda variável começam a deixar de serem tão atrativos e começar a ocorrer um fluxo de capital para a renda fixa. Tudo contribuindo para que as ações tenham suas cotações afetadas.
Isso tudo, em conjunto do dólar em alta, incertezas políticas e preço de matérias primas, contribui para um ciclo de baixa contínua. Nesses momentos, nos resta pouco a fazer a não ser sentar e esperar. No KE, podemos diminuir nossa exposição a renda variável e começar a aumentar a posição em outros investimentos de renda fixa. Já no KD, devemos focar em empresas que não necessitam de forte alavancagem operacional e que sejam maduras. Boas pagadoras de dividendos são uma ótima opção.
Agora ficou mais fácil de entender o que está acontecendo, né? O buraco vai muito mais a fundo do que você imaginava. Nesses momentos, fique tranquilo e mantenha a calma.