
Não se deixe levar pelo viés de ancoragem nas suas decisões. Por Ricardo Schweitzer*

Algumas coisas parecem simplesmente inescapáveis.
A cada vez que eu abro uma caixa de perguntas no meu Instagram, a história se repete: sempre – eu disse SEMPRE – tem alguém perguntando qual é o preço médio de alguma das posições da minha carteira.
Eu realmente me pergunto qual é o significado que as pessoas buscam nesse tipo de coisa. Entre inúmeras possibilidades, só tenho uma certeza: não, a resposta não está lá.
Um preço médio de compra simplesmente nos diz que, em dado(s) momento(s) do tempo, um investidor entendeu que certo ativo a certo preço representava uma oportunidade com potencial de retorno adequado ao risco. Mas isso é só um pedaço da história; e um pedaço muito pequeno.
Primeiro, porque não sabemos se aquela média é fruto de uma ou mais operações realizadas a preços semelhantes ou se há compras realizadas a muitos preços distintos que produzem um número no meio do caminho que pouco ou nada tem a ver com a avaliação do comprador.
Segundo, porque o preço médio é um retrato do passado: não necessariamente a avaliação feita lá atrás segue válida, pura e simplesmente porque fatos ocorreram com a empresa desde então que podem incentivar a revisão de premissas.
Terceiro, porque o preço médio pouco (ou nada) diz a respeito do atual grau de confiança na tese: digamos que uma ação é negociada hoje 50% abaixo do meu preço médio de compra. O fato de eu ainda mantê-la não necessariamente implica na expectativa de ver o preço de compra alcançado ou superado – pois, como disse acima, a realidade pode ter imposto uma revisão de premissas -, mas tão somente na expectativa de vê-lo suficientemente acima do atual a ponto de justificar a manutenção da posição.
(Aliás, se o objetivo de quem questiona é medir o grau de confiança na tese, penso eu que muito mais proveitoso seria perguntar de quanto é a exposição ao invés do preço médio. Faz diferença ter 1%, 5% ou 30% da carteira em determinado ativo…)
Essa fixação por preço médio tem muito a ver com um viés comportamental chamado viés de ancoragem. Basicamente, nossos cérebros têm certa dificuldade em mensurar coisas em termos absolutos, então busca referências nas quais se balizar: pode ser um preço daquele mesmo ativo num momento passado, ou o preço de um ativo similar… enfim: temos a tendência de formar expectativas a partir de referências que não necessariamente seguem válidas ou fazem algum sentido.
É a famosa história da ação que cai e o sujeito encasqueta que só vai vender quando voltar ao preço original. Ou da ação que supostamente vale a pena comprar pura e simplesmente porque caiu muito… e por aí vai.
Simplesmente não funciona assim, minha gente.
Vamos combinar assim: preço médio não importa. Ele é um retrato do passado que não deve servir para absolutamente nada nas suas decisões de hoje. Importa o preço de hoje: com base nas suas expectativas, a ação oferece bom potencial de retorno a partir do preço atual ou não? E essas expectativas foram formadas a partir de bases razoáveis ou não?
E vou além: dentre os demais ativos no mercado, a preços de hoje, existem outras alternativas que ofereçam potencial melhor (mais retorno para o mesmo risco, ou menos risco para o mesmo retorno ou ainda menos retorno mas ainda menos risco…) do que a ação que você já tem?
Não tenha medo de mudar de ideia. Faz parte do processo. Só cuidado para não mudar só por mudar.
E pare de manjar o preço dos outros: você não faz a menor ideia da sucessão de acontecimentos que nele resultaram e não tirará quase nada de bom disso.
*Ricardo Schweitzer é analista CNPI, consultor CVM e investidor profissional.
Twitter: @_rschweitzer, Instagram: @ricardoschweitzer