Josilmar Cordenonssi Cia, professor de finanças da Universidade Presbiteriana Mackenzie

A política tarifária de Trump e as implicações ao Brasil

A política tarifária de Trump e as implicações ao Brasil | Artigo por Josilmar Cordenonssi Cia, professor de Finanças da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

A primeira manifestação política de Donald Trump ocorreu em 1987, quando criticou a política externa dos EUA, acusando aliados de se beneficiarem sem custos da defesa americana e de terem acesso irrestrito ao mercado americano.

Em seu primeiro mandato (2017-2021), impôs tarifas sobre vários produtos, incluindo o aço brasileiro, mas muitas foram revertidas ou convertidas em cotas.

Trump atribui sua derrota em 2020 à influência do chamado “Deep State” (“Estado Profundo”), isto é, os seus próprios assessores e burocratas que supostamente o impediram de implementar suas ideias.

Reeleito em 2024, Trump montou um secretariado baseado na lealdade e não na experiência. Seu governo reflete suas ideias sem oposição, nem mesmo do Congresso, que é controlado pelos republicanos, que, por sua vez, são dominados por Trump.

O ataque ao “Deep State” ficou a cargo do bilionário Elon Musk, um secretário informal, que tem mais poder que a maioria dos secretários (equivalentes ao cargo de ministro no Brasil) e que, sob o pretexto de cortar gastos do governo, está aproveitando para remover profissionais que não estão alinhadas ideologicamente à nova gestão.

Muitas dessas mudanças estão sendo revertidas pela justiça, mas nem todas. O funcionalismo público americano está vivendo um momento de muita insegurança. Trump não quer ter nenhum movimento contrário aos seus planos.

Com relação às tarifas comerciais, de certa forma, Trump tem razão de que o comércio internacional não é livre e nem justo. Se assim o fosse, não haveria países com superávits comerciais persistentes (que exportam mais que importam) e nem lugares com déficits crônicos, como os EUA.

Outros países, além de impor tarifas altas de importação, podem manter taxas de câmbio excessivamente desvalorizadas, incentivando as suas exportações e, consequentemente, tornando as importações caras.

A OMC fracassou, de certa forma, ao fazer com que os países fossem além das políticas tarifárias e introduzissem medidas que impedissem a manipulação cambial e a repressão da demanda interna por parte dos países superavitários.

A soma de todos os superávits é a mesma que a soma de todos os déficits dos países, pois não há comércio entre terráqueos e extraterrestres (ainda?).

Um país que tem déficit no comércio de bens e serviços está necessariamente investindo mais do que poupando, ou seja, está “importando” poupança externa na forma de endividamento ou redução de ativos no exterior.

E os países superavitários poupam mais do que investem, “exportando” poupança ao resto do mundo.

Portanto, a aplicação de tarifas não irá garantir que os EUA sejam superavitários, para isso eles têm que aumentar a poupança doméstica (privada e pública) e/ou diminuir os investimentos.

Nos dois casos isso tenderá a levar a uma queda de atividade ou até uma recessão.

Os EUA nunca se preocuparam muito com seus déficits persistentes, até promoviam acesso privilegiado ao mercado americano como estratégia geopolítica.

Depois da II Guerra Mundial, a Europa e o Japão poderiam exportam aos EUA com tarifas baixas para fomentar a reconstrução econômica destes países e afastá-los de uma eventual influência da antiga União Soviética (URSS). A Coreia do Sul também teve um acesso privilegiado.

O ex-presidente Nixon quis atrair a China comercialmente ao mercado americano, de forma a criar uma cisma entre os dois maiores países do bloco socialista, enfraquecendo a URSS na Guerra Fria e, simultaneamente, fortalecendo o dólar e o sistema financeiro americano.

Por ter a moeda usada como reserva internacional por praticamente todos os países do mundo, o dólar tende a ter uma sobrevalorização estrutural, dificultando os exportadores americanos e facilitando as importações.

Com a globalização, os EUA perderam competitividade na indústria, exportando empregos para Ásia e México. A produtividade aumentou, mas os salários não acompanharam, causando insatisfação na classe operária e tornando atrativo o discurso populista e protecionista.

Trump e seus assessores ignoram totalmente os ensinamentos de David Ricardo, um economista britânico do século XIX, que mostrou que o livre mercado é benéfico aos países envolvidos por conta de cada um se especializar em produzir produtos e serviços onde tem vantagens comparativas relativas (e não absolutas) em relação aos demais.

A indústria americana é mais produtiva do que a japonesa e chinesa, mas nem por isso traz empregos de volta aos EUA.

Isso acontece porque os setores mais intensivos em tecnologia, como design de produtos e equipamentos e programação, são relativamente mais produtivos ainda em relação aos outros países.

Assim, transferir empregos e investimentos de setores mais produtivos para os menos produtivos iria reduzir a produtividade global da economia americana.

No limite, o que está sendo proposto é tirar um programador do Vale do Silício e mandá-lo extrair carvão para a indústria siderúrgica, é um total contrassenso.

Atualmente, o desemprego nos EUA está em 4%, sem necessidade de criação massiva de empregos, pois está praticamente em pleno emprego.

As tarifas, junto com a repressão à imigração ilegal, podem aumentar salários, colocando mais pressão na inflação.

As empresas americanas e estrangeiras hesitam em investir nos EUA devido às incertezas vindas da Casa Branca.

As medidas são anunciadas de modo totalmente informal e, muitas vezes, revertidas na mesma semana.

Com essa instabilidade, em vez de estimular investimentos produtivos, que Trump tanto quer, pode colher paralisia decisória das empresas e estagnação econômica.

O erro mais grosseiro foi a imposição de tarifas a aliados estratégicos como Canadá e México, violando acordos comerciais pré-existentes como o USMCA, negociado pelo próprio Trump em seu primeiro mandato.

Isso mina a confiança internacional nos EUA, favorecendo alianças comerciais alternativas. O Brasil, até o momento, sofreu poucos impactos, limitados às tarifas sobre aço e alumínio.

A resposta do governo brasileiro tem sido pragmática, evitando retaliações e focando no diálogo liderado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.

O Brasil pode se beneficiar desse cenário ao estreitar laços comerciais com a União Europeia, especialmente negociando com França e Polônia para diminuir as resistências e acelerar a ratificação do acordo Mercosul-UE.

Países como Canadá e México, afetados diretamente pelas tarifas de Trump, também podem se mostrar mais abertos a novas parcerias.

Assim, o Brasil deve priorizar o multilateralismo e buscar novas oportunidades comerciais para minimizar os impactos da imprevisibilidade da política tarifária americana.

Espero que o Brasil tenha aprendido que o caminho do desenvolvimento passa pela abertura comercial. É um meio eficaz e rápido para aumentar a produtividade da economia, impulsionado o crescimento.

Entretanto, é uma condição necessária, mas não suficiente. O nosso calcanhar de Aquiles, a falta do equilíbrio das contas fiscais, também afeta a política comercial.

O governo precisa fazer um ajuste de suas contas, aumentando a poupança interna, que fará com que a taxa de juros caia de modo sustentável, e que a nossa moeda não fique valorizada pelo investimento de curto prazo (smart money), que acaba reduzindo a competitividade dos exportadores brasileiros. 

Autor: Josilmar Cordenonssi Cia, professor de Finanças da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

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Edição visual da página: Ernani Fagundes, jornalista especializado (MBA da B3) em informações econômicas, financeiras e de mercado de capitais.

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